Editorial | Ações culturais e meios digitais

Autores

  • Marcelo Tramontano Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
  • João Paulo Soares Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
  • Luciana Santos Roça Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
  • Priscilla Marchetto Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo

Resumo

Já desde há alguns anos que várias pesquisas do Nomads.usp, o Núcleo de Estudo de Habitares Interativos da Universidade de São Paulo, que edita a V!RUS, têm se preocupado em explorar a aplicação de meios digitais na concepção e uso de objetos e espaços do quotidiano. Quer-se, assim, tornar visíveis ou mesmo estimular o surgimento de relações pouco perceptíveis na realidade concreta, e nem por isso menos importantes. Ampliando essa ideia, o Núcleo tem, mais recentemente, buscado verificar possibilidades de uso de meios digitais na valorização da diversidade cultural de populações de um mesmo bairro, de uma cidade, do país ou mesmo entre populações de diferentes países, através das ações culturais propostas pelo projeto de pesquisa em políticas públicas Territórios Híbridos <www.nomads.usp.br/territorios.hibridos>.

É especialmente por essa razão que, nessa sétima edição da revista V!RUS, decidimos aprofundar a reflexão sobre o tema, buscando interlocução com pessoas externas ao Nomads.usp. O crivo editorial preferiu apresentar mais do que modos operacionais dessas práticas, procurando enfocar seus processos e seu papel de estimulador de reflexões de pessoas e comunidades. Ganhando relevância em termos culturais e sociais, os meios digitais revelam-se estruturadores em muitos casos, podendo contribuir para os objetivos de transformação social das políticas culturais de Estado.

Como em todas as edições da V!RUS, buscamos justapor abordagens variadas sobre o tema proposto. Assim, na seção Artigos Convidados, duas colaborações apresentam considerações sobre questões culturais importantes, e paralelos com a utilização de meios digitais. Primeiramente, viesado por um olhar plural e multifacetado sobre possibilidades de ações de cunho cultural relacionadas a questões sociais, Gesche Joost e Tom Bieling, pesquisadores no Design Research Lab da Universidade de Artes de Berlim, trabalham o design como atividade capaz de propiciar alterações na esfera social, discutindo a ação da criação em design com seu artigo Design contra a normalidade. Na mesma seção, o texto de Georges Teyssot discute o uso de diagramas como ferramentas nos processos de criação em design e arquitetura.

Na seção entrevista, Fred Paulino e Lucas Mafra, integrantes do Coletivo Gambiologia, de Belo Horizonte, tratam do uso de meios digitais inspirando-se na tradição brasileira da gambiarra e do improviso, discutindo alguns dos conceitos que respaldam as atividades do grupo, como a noção de indeterminismo e a utilização de elementos da cultura de rua na produção de arte e design.

Os artigos da seção Submetidos, propositalmente menos numerosos a partir dessa edição, costumam apresentar posturas diversificadas sobre o tema da edição. Santiago Cao aborda relações entre corpo e performance no contexto dos meios digitais através da obra Espacios [In]Seguros, apresentando um interessante percurso teórico acerca de entendimentos sobre espaços, performance e corpo. Ultrapassando o caráter de registro da fotografia, Carolina Moreira de Hollanda discorre sobre a sua utilização na compreensão de situações urbanas peculiares, empregando a imagem como suporte técnico investigativo.

Também trabalhando a efervescência e a diversidade cultural de centros urbanos como possibilidades investigativas, Hannah le Roux, Nonthokozo Mhlungu Stephen Hoffe trazem uma leitura instigante e nada convencional de aspectos culturais de uma região da cidade de Johanesburgo, na África do Sul, a partir de procedimentos que fogem de métodos clássicos. O artigo apresenta questões culturais locais, utilizando a moda e as narrativas dos comic books como chaves de leitura para entender aspectos da dimensão cultural das regiões pesquisadas.

No contexto brasileiro, Alex Garcia, Heloisa Neves e Paulo Eduardo Fonseca escrevem sobre a primeira oficina de fabricação digital voltada para crianças, no Brasil, com o projeto Fab Lab Kids vinculado ao laboratório internacional Fab Lab do MIT – Massachusetts Institute of Technology. O texto apresenta a oficina realizada na cidade de Guarulhos, com seu desenvolvimento como atividade de cunho cultural utilizando tecnologias digitais de desenho e fabricação em design.

Fechando a seção de artigos submetidos, Graziele Lautenschlaeger, Rita Wu e Daniela Kutschat apresentam a instalação interativa “De Novo, Ercília”, montada pela primeira vez na Mostra LabMis 2011, como uma possibilidade de se entender questões urbanas, como sua cultura, população e lógicas de organização através de elementos interativos baseados em meios digitais.

Além de artigos com caráter estritamente acadêmico, a revista V!RUS busca explorar o tema de cada edição através de formatos textuais livres, na seção Tapete. Nela, Diego Pimentel traz uma breve discussão sobre interfaces digitais e sua utilização como meio de comunicação. Christoph Walther apresenta o projeto WeSea, através de um texto construído colaborativamente com outros membros da coordenação do projeto. O WeSea enfoca a recuperação da região do mar Báltico a partir da constituição de uma rede de comunicação e trocas cujo objetivo é criar uma estrutura para o encontro de indivíduos, estimulando a colaboratividade e a implementação de projetos culturais na região.

Ainda na seção Tapete, o texto Trans(formações) de Ricardo Rodrigues e Maithe Bertolini apresenta brevemente a história do festival multimídia colaborativo Contato, realizado anualmente desde 2007 na cidade de São Carlos, SP. A organização colaborativa do festival procura trazer gratuitamente à cidade artistas independentes, da música à arte multimídia. Também no âmbito da colaboratividade, Mariana Felippe Val Rocha apresentam uma integração de instâncias virtuais e concretas através do jogo, em práticas do Instituto Elos. O texto de Djalma Ribeiro Junior lança um olhar sobre a utilização dos meios digitais na construção e divulgação de produções audiovisuais e explora de maneira crítica como tais produções podem ser postas a serviço da educação e da comunicação, em diferentes contextos culturais.

Segundo um dos objetivos da revista V!RUS que é o de expor à leitura e ao questionamento, na seção Artigo Nomads, resultados de pesquisa do Nomads.usp, Daniel Paschoalin Anja Pratschke revisitam o conceito de diálogo e de aspectos da teoria da Conversação relacionando-os com ações culturais que se utilizam de meios digitais como elemento estruturador.

Karla Brunet na seção Projetos discute um modelo descentralizado de redes de cultura P2P, identificando o P2P como um modelo de intercâmbio, cooperação e recriação coletiva. Para isso, Karla Brunet basea-se no exemplo da rede Submidialogia, que tem como base a descentralização dos conteúdos e procurando um equilíbrio entre a teoria e a prática.

Na seção Resenha, excepcionalmente também de autoria de uma pesquisadora do Nomads.usp, o texto de Luciana Santos Roça apresenta um panorama sobre algumas intervenções sonoras híbridas – dotadas de instâncias concretas e virtuais – que visam fazer emergir aspectos espaciais pouco visíveis.

Finalmente, notaremos que as imagens que se alternam no fundo da página inicial da revista, na seção Sumário, exibem instantâneos de ações culturais que o Nomads.usp vem realizando utilizando meios digitais diversos, no projeto de políticas públicas Territórios Híbridos. As imagens também são fundo das diferentes seções da edição, e podem ser apreciadas no ensaio abaixo.

Desejamos a todas e a todos excelente leitura!

Figura 01: Crianças utilizando tablet em ação do projeto Territórios Híbridos. (Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2012)

Figura 02: Ação Fotos, inauguração da exposição Cenas Urbanas, em São Carlos. A ação fotos aproximou olhares de Uberaba-MG e Rio Branco-AC e sua inauguração aconteceu simultaneamente nessas cidades, integradas através de livestream. (Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2012).

Figura 03: Ação Diálogos Culturais em Lünenburg, Alemanha, banda Parashurama tocando em livestream com São Carlos, Brasil.(Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2012)

Figura 04: Pessoas na praça durante o CDHU Cultura Fest, parte do projeto Territórios Híbridos. O CDHU Cultura Fest promoveu ações de graffiti digital e também promoveu uma apresentação remota entre grupos SubLoco Coletividade e Malditas Ovelhas, dentre outras atividades. (Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2012)

Figura 05: Ação Graffiti Digital, realizada em 2011 no Instituto de Arquitetura e Urbanismo, promovendo atividades de graffiti digital por tablets laser pointers, além de promover comunicação remota entre o evento de São Carlos-SP e de Belo Horizonte-MG. (Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2011)

Figura 06: Ação Diálogos Culturais, na Alemanha. A ação procurou realizar um diálogo sonoro por livestreaming entre os grupos Aquarpa (em São Carlos, Brasil) e Parashurama (em Lüneburg, Alemanha). (Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2011)

Figura 07: Projeção de graffiti digital por tablet realizada por graffiteiros. Palco do Grito Rock, em parceria com o Fora do Eixo e a Prefeitura Municipal de São Carlos. São Carlos, Brasil. (Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2012)

Figura 08: Membro do Fora do Eixo, com a projeção de comentários do público do Grito Rock ao fundo. (Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2012)

Figura 09: Ação Conjuntos no Instituto Pombas Urbanas. Cidade Tiradentes, conjunto habitacional de São Paulo, Brasil. (Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2011)

Figura 10: Ação Fotos, inauguração da exposição Cenas Urbanas, em São Carlos. Projeção de comentários do público, livestream de Uberaba-MG e Rio Branco-AC, e fotos. (Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2012)

Figura 11: Ação Diálogos Culturais em Lünenburg, Alemanha, banda Parashurama e organização se preparando para o livestream com São Carlos, Brasil. (Fonte: banco de dados Nomads.usp, 2011)

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Biografia do Autor

Marcelo Tramontano, Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo

É arquiteto, Doutor e Livre-docente em Arquitetura, Professor Associado na Universidade de São Paulo e coordena o Nomads.usp.

João Paulo Soares, Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo

É arquiteto e pesquisador do Nomads.usp. Pesquisa processo de criação em arquitetura e design sob o olhar da teoria de sistemas, com ênfase na utilização de meio digitais através de software paramétricos.

Luciana Santos Roça, Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo

É bacharel em Imagem e Som e pesquisadora do Nomads.usp. Pesquisa a utilização de interfaces sonoras em espaços urbanos, procurando integrar os campos disciplinares de Estudos de Som e de Arquitetura.

Priscilla Marchetto, Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo

É arquiteta e pesquisadora do Nomads.usp. Pesquisa a diversidade de modos de vida e a coexistência em instâncias híbridas em processos comunicacionais estruturados por meios digitais, sob um olhar viesado por estudos da Antropologia.

Publicado

01-07-2012